O desfecho do caso que abalou o Brasil e ganhou destaque mundial finalmente chegou com a sentença dos ex-sargentos da Polícia Militar do Rio de Janeiro, Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz. Eles foram condenados pelo homicídio da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, na noite de 14 de março de 2018, no Rio de Janeiro. A condenação marca um ponto importante na luta pela justiça e pela memória de Marielle Franco, cujo assassinato gerou comoção e levantou debates sobre violência política e a atuação de milícias no país.
Condenação e Sentença de Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz
Em uma decisão histórica, a Justiça condenou Ronnie Lessa a 78 anos e 9 meses de prisão, enquanto Élcio de Queiroz recebeu uma pena de 59 anos e 8 meses. A sentença foi lida pela juíza Lúcia Glioche no 4º Tribunal do Júri da Justiça do Rio de Janeiro, após dois dias de intensas audiências e depoimentos das partes envolvidas. Ambos os réus foram considerados culpados pelos crimes de duplo homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, emboscada e dificuldade de defesa das vítimas) e tentativa de homicídio contra Fernanda Chaves, assessora de Marielle e única sobrevivente do atentado.
Além das penas de reclusão, os condenados deverão arcar com pensões e indenizações às famílias das vítimas. Eles deverão pagar pensão ao filho de Anderson Gomes até que complete 24 anos. Também foram ordenados a pagar uma indenização de R$ 706 mil por dano moral a cada uma das cinco vítimas: Arthur, filho de Anderson; Ágatha Arnaus, viúva de Anderson; Luyara Franco, filha de Marielle; Mônica Benício, viúva de Marielle; e Marinete Silva, mãe de Marielle.
O Julgamento de Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz
O julgamento começou na manhã de quarta-feira, 30 de outubro, e foi transmitido por videoconferência, com os réus acompanhando da prisão. Ronnie Lessa está detido no Complexo Penitenciário de Tremembé, em São Paulo, e Élcio de Queiroz, no presídio federal da Papuda, em Brasília. Durante os dois dias de sessão, foram ouvidas nove testemunhas, entre elas sete indicadas pelo Ministério Público e duas pela defesa de Ronnie Lessa. A defesa de Élcio Queiroz optou por não apresentar suas testemunhas.
No primeiro dia do julgamento, foram apresentados detalhes das investigações e depoimentos que reforçaram a acusação de que os réus agiram de maneira premeditada. O segundo dia de julgamento foi marcado pela apresentação das alegações finais das partes. O promotor de Justiça Eduardo Martins, representando o Ministério Público do Rio de Janeiro, defendeu que o objetivo de Ronnie Lessa ao disparar era eliminar todas as testemunhas do crime, reforçando a tese de "queima de arquivo". Durante suas alegações, Martins apresentou imagens do carro das vítimas após o ataque e destacou as pesquisas realizadas por Lessa na internet, que incluíam buscas relacionadas ao crime.
A Defesa de Lessa e Élcio: Argumentos e Posições
Durante suas alegações, a defesa buscou diferenciar o papel de cada réu no crime, ressaltando a colaboração de Lessa com as investigações por meio de delação premiada e minimizando a responsabilidade de Élcio de Queiroz, que, segundo a defesa, apenas dirigia o veículo no momento do ataque.
O advogado de Ronnie Lessa, Saulo Carvalho, afirmou que seu cliente teria oferecido uma importante contribuição ao identificar os mandantes do crime, colaborando com a Polícia Federal ao confessar o seu envolvimento e detalhar informações sobre a execução. A advogada de Élcio, Ana Paula Cordeiro, sustentou que seu cliente não tinha conhecimento do alvo do crime até instantes antes do ataque, argumentando que sua condenação fosse "justa", mas menor do que a de Lessa, que teria idealizado e executado o homicídio.
O Impacto e os Desdobramentos do Caso Marielle Franco
A morte de Marielle Franco, uma das vozes mais atuantes em defesa dos direitos humanos e da representatividade política, trouxe repercussões significativas para o Brasil e o mundo. O caso Marielle Franco gerou debates sobre a atuação de milícias e a violência política, especialmente no Rio de Janeiro, onde disputas de poder e o controle de territórios são constantes. Desde o início das investigações, evidências apontaram para a participação de milicianos no crime, revelando o papel de grupos paramilitares em questões de segurança e política locais.
As investigações, que começaram com as prisões de Lessa e Queiroz em março de 2019, evoluíram ao longo dos anos e levaram à prisão de novos suspeitos. Em 2021, Ronnie Lessa e outros foram condenados por destruição de provas relacionadas ao assassinato. Em 2022, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que Lessa enfrentaria júri popular. Em 2024, três homens foram detidos como possíveis mandantes do crime: Domingos Brazão, Chiquinho Brazão e Rivaldo Barbosa, todos apontados por Lessa em sua delação. Embora os acusados neguem envolvimento, as autoridades continuam a investigar o papel das milícias e suas motivações.
Legado de Marielle Franco e a Luta por Justiça
Para além da busca pela condenação dos executores, o caso Marielle Franco tornou-se símbolo de resistência e luta por justiça social no Brasil. A trajetória da vereadora — mulher, negra, de origem periférica e uma das defensoras mais firmes dos direitos humanos — inspirou movimentos sociais, principalmente entre jovens e grupos marginalizados, que se identificavam com sua história e seus ideais.
Desde sua morte, surgiram projetos e campanhas em memória de Marielle Franco, como o Instituto Marielle Franco, fundado pela família da vereadora para dar continuidade ao trabalho que ela desempenhava e lutar por direitos civis e justiça social. A defesa de seu legado também levou à formulação de políticas públicas e a discussões no cenário legislativo, reforçando a importância de combater a violência política e garantir a segurança de ativistas e representantes eleitos.
Conclusão
O caso Marielle Franco trouxe à tona uma série de questões importantes para a sociedade brasileira, desde a violência urbana até o papel das milícias e o combate à impunidade. Com a condenação de Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, a Justiça dá um passo importante na busca por responsabilizar os envolvidos no crime, embora o processo para desvendar o papel dos mandantes e outros possíveis colaboradores ainda continue.
A luta por justiça no caso Marielle Franco vai além das sentenças, inspirando uma nova geração a reivindicar segurança, democracia e representatividade. A esperança é que, ao responsabilizar os culpados, seja possível avançar em direção a um país mais justo e seguro para todos.