A estética da leveza — e do adoecimento No feed, tudo parece em ordem: pele luminosa, cabelo alinhado, legenda motivacional.
No feed, tudo parece em ordem: pele luminosa, cabelo alinhado, legenda motivacional. A trilha sonora é suave, o quarto recebe luz natural, e o corpo quase desaparece.
Essa é a nova estética que domina o Instagram e o TikTok: as clean girls. Meninas minimalistas, "leves", sempre com uma água aromatizada na mão, uma saladinha no prato e o orgulho de terem vencido mais um dia sem "exageros".
Mas por trás dos vídeos em câmera lenta e das manhãs ensolaradas, esconde-se uma epidemia silenciosa. Adolescentes estão adoecendo em nome de um corpo idealizado, vendido como saudável — mas construído à base de jejum extremo, restrições alimentares severas e culpa disfarçada de disciplina.
Hospitais de grandes capitais já relatam um aumento preocupante no número de jovens internadas com sintomas de desnutrição, hipoglicemia e colapsos hormonais. Muitas delas não aparentam ter distúrbios alimentares à primeira vista.
Elas dizem apenas que estão "em busca de equilíbrio", "comendo limpo", "eliminando toxinas". Mas o vocabulário do sofrimento mudou. O transtorno não se declara — ele se disfarça.
No TikTok, vídeos com a hashtag #thatgirl somam bilhões de visualizações. A proposta parece inofensiva: seja organizada, faça sua cama, tome suco verde, treine ao amanhecer.
Mas no meio desse conteúdo surgem rotinas de alimentação com 600 calorias diárias, jejuns de 18 a 24 horas, corpos que já não menstruam — mas continuam sendo exaltados como modelos de saúde.
Na geração anterior, era mais fácil reconhecer o perigo. Grupos pró-anorexia e pró-bulimia usavam hashtags como thinspo ("thin inspiration") e circulavam com imagens explícitas de corpos em sofrimento.
Hoje, tudo isso voltou — mas com outra embalagem.
A estética atual é silenciosa, polida, clean.
As adolescentes publicam receitas sem glúten, posam com roupas bege, exibem corpos secos e dizem que estão apenas "se cuidando". A saúde física ruindo. A saúde mental, ainda mais.
O vazio por trás dos olhos das clean girls é o que realmente deveria viralizar.
Enquanto os seguidores crescem, o corpo encolhe. E a alma grita — mas ninguém ouve.
Elas acreditam que estão no controle. Sentem-se fortes por rejeitar comida, descanso, prazer. Mas o que era para ser leveza virou obsessão. O que era para ser saúde virou silêncio. E o que era para ser escolha virou prisão.
Nos bastidores, mães sem saber o que fazer. Pais achando que é só uma fase. Educadores sem preparo para lidar com uma estética que parece saudável, mas que está matando — aos poucos.
O corpo clean virou moda.
Mas a dor por trás da tendência não aparece nos stories.
E talvez, quando aparecer, seja tarde demais.
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